Esse relato cobre os eventos de 14/09/2019 a 19/09/2019
Olá companheiros de jornada.
Peço perdão pela demora para atualizar o blog, mas estava enfiado em umas trilhas cheias de neve no meio dos Himalaias. Isso mesmo, nada demais, só arriscando minha vida perto das maiores montanhas do mundo, e você o que andou fazendo? Como foi a aula de pilates essa semana? (Desculpa, eu acho horrível esse sentimento de “minha vida é mais legal”, até porque não é, mas esses últimos dias foram especiais demais – vou “me achar” um pouco).
Mas esse relato aqui é sobre a China, não sobre o Nepal, então vou voltar até o ponto onde o último texto terminou. Após o final feliz da desastrosa estadia em Xangai embarcamos em um trem para Zhangjiajie, uma cidade que fica próxima de um parque nacional de mesmo nome. Um lugar que eu também nunca acerto a grafia, por isso perdoem os possíveis erros nesse humilde escrito.
Enfim, Zhangjiajie é uma cidade bem mais ao sul que Pequim e também um pouco mais ao interior/oeste do que todas que tínhamos visitado (mas ainda naquela faixa perto da costa onde praticamente a China inteira vive), se eu disser que está no sudoeste chinês seria bem errado.
A cidade é bem sem graça, cinza e em construção – aliás, a China parece um país em construção, todo lugar que íamos tinha obra, obra, obra…talvez um reflexo dos saltos econômicos das últimas décadas. O interessante é que a região em volta da cidade é sensacional. Montanhas sagradas, grandes lagos, parques nacionais e até vilas antigas e super tradicionais. Se algum de vocês for para lá um dia use Zhangjiajie apenas como base e conheça os arredores.
Os leitores mais fiéis devem se lembrar que Xangai foi uma cidade marcada pelo descanso e a falta de saúde intestinal, algo que deu uma desanimada geral na viagem e para com a China. Zhangjiajie foi uma cidade de perrengues, mas foi também sensacional, reabasteceu nosso ânimo. Aaaa China, sua grande montanha-russa.
No nosso primeiro dia visitamos a Montanha Tianmen, um complexo de escarpas com um pico bem bonito que fica bem colado a cidade. Para chegar lá (ou descer de lá) vale pegar o teleférico – é o maior caminho de teleférico do mundo e bacaninha de usar. O dia estava nublado, o que limitou a visão, mas ao mesmo tempo cortamos as nuvens com nosso bondinho super vitaminado. O ruim foi ter esperado 2 horas na fila, pois na China tudo é fila (quando a fila existe). O topo da montanha é incrível, normalmente acima das nuvens e o clima lá é sempre de “mistério e sagrado”. Também tem umas passarelas de vidro para você andar na beira da montanha e olhar para o precipício abaixo. Achei bem sem graça, mas tinha uma galera com medo. Acho que nem todo mundo pode sustentar a(s) alcunha(s) de: Nathan Drake BR, Wolverine Brasileiro e Indiana Jones Brasuca. Por enquanto as únicas coisas que me colocaram medo na viagem foram os desarranjos intestinais e o medo de ser um fracasso constante apenas fingindo pro mundo que sei fazer algo que presta. Acho que talvez o segundo ponto deveria ser debatido com um psicólogo, não com vocês aqui.
Voltando.

Subimos o teleférico e descemos por umas escadas até a base da montanha, onde pegamos um ônibus de volta para o ponto de saída do bondinho. Na base fica um negócio chamado “Porta do Céu”, que é uma abertura gigante entre as rochas e para chegar lá você sobe (ou desce) uma escada de 999 degraus. É incrível porque realmente parece que você está indo em direção a algo divino, mas ai um batalhão de pessoas cuspindo ao seu lado te lembra que é só uma atração turística.

Voltamos de ônibus pela estrada das 99 curvas (tudo tem “9” pois é um número sagrado para o Taoísmo chinês), um caminho bem bonito e bem propício para agitar as entranhas dos mais frágeis.
A montanha Tianmen é um lugar especial, mas como a maioria dos locais na China, estava bem cheia. Gostaria muito de conhecer o lugar com calma e silêncio, deve ser uma experiência quase espiritual.

O segundo dia foi um dia de burrices e perrengues. Fomos até o Parque Nacional de Zhangjiajie, que tem muita coisa, mas a atração principal é uma cadeia de montanhas que parecem pilares saindo da mata (erosão devido ao vento e chuva). Sim, são aquelas montanhas do filme Avatar. Uma vista incrível.
Chegamos ao parque pelo portão errado, pois pegamos o ônibus quase errado (digo “quase errado” porque erramos o portão, mas chegamos aonde queríamos) graças a maravilhosa rodoviária da cidade e nossa falta de capacidade para acertar o transporte. Logo percebemos que tínhamos um parque todo para atravessar durante o dia, pois a atração que queríamos ver era perto da entrada contrária à nossa e era lá também onde deveríamos pegar a van mais barata de volta até a cidade.
Parece uma tarefa simples, mas lá dentro a locomoção é feita por uma frota de ônibus própria e não da para entender muito onde eles vão parar. Não ajudou o fato de não termos um mapa ou tradutor. Andamos a esmo até que chegamos em um ponto que tinha um elevador gigante que parecia o único jeito de acessar aonde queríamos chegar. Só que o elevador era muito caro, ficaríamos com o dinheiro contado após ele (a entrada do parque já tinha sido bem cara). Provavelmente existia um outro jeito de chegar até nosso objetivo, mas estávamos cansados e pelo o que vimos as atrações chinesas funcionam assim: sempre existe o jeito “fácil” e caro de fazer as coisas (como chegar em um lugar por teleférico ou elevador) e o jeito difícil, que normalmente é mais barato e pouco divulgado. Optamos pelo jeito fácil e a vida nos deu uma rasteira.
Para acelerar a história – pegamos o elevador, nos perdemos na parte “de cima” do parque, achamos o caminho para o portão que queríamos sair, era longe, tínhamos que pegar um teleférico mas o dinheiro havia evaporado. Para melhorar era cerca de 4:30 da tarde e a última van para cidade saia às 18h.
Por sorte encontramos um casal de canadenses (únicos outros gringos no local) que conhecia uma trilha para evitar o teleférico. Economizamos o dinheiro que não tínhamos, mas não chegamos em tempo de pegar o transporte. Estávamos longe do nosso hotel, sujos e sem dinheiro. Mas é nessas horas que a mágica acontece.
Ficamos no mesmo hostel que os canadenses, pois era dentro do parque, só que não tínhamos dinheiro para pagar. Eles pagaram pra gente e minha irmã conseguiu transferir grana via paypal para eles. No fim terminamos a noite imundos, sem nossas coisas, sem dinheiro, mas trocando ideia com uns canadenses ao pé de umas montanhas chinesas. Eles ainda pagaram várias cervejas para nós. Foi bizarro e sensacional, como a vida consegue ser às vezes.

No dia seguinte conseguimos voltar ao nosso hotel – eu de ressaca e ambos quebrados, por isso me premiei com uma coca e um McDonald’s da vitória. Nada como comida de baixa qualidade e alto teor de gordura para agradar um homem simples.
Aaaa mas e o parque, vocês estão se perguntando – Sim, o parque é foda. Bem cuidado e com uma floresta fechada, que parece quase tropical, é inundado de montanhas e elevações de granito. As montanhas Avatar são surreais, vale conhecer. Vou colocar algumas fotos aqui mas elas não fazem jus ao que é ver aquele complexo de pilares gigantescos que pairam sobre um mar verde. É uma visão quase onírica.


E o parque ainda tem outras atrações, como uma floresta de macacos, alguns monastérios, um lago… A entrada vale por 4 dias, então da para ir e voltar e conhecer tudo com calma (algo que não fizemos pois somos BURROS). Aliás vale ficar mais tempo em Zhangjiajie, ficamos 3 dias completos, mas gastamos o último dia no hotel resolvendo algumas coisas que explicarei a seguir.

Último adendo antes de prosseguir – já falei isso lá em cima, mas vou desenvolver melhor o pensamento agora: as atrações na China tem boa estrutura e acesso fácil, e normalmente esse acesso fácil é o modo easy e tranquilo para conseguir informações e etc… e eles deixam o jeito “alternativo” mais difícil de encontrar/acessar. É elevador e bondinho em tudo quanto é trilha. Se cortassem metade dessas engenhocas dava para diminuir em uns 60% o número de velhos e famílias turistando por ai. Eu quando for velho vou querer ficar jogando video game em casa, que se dane o mundo. (É uma piada gente, calma).
Enfim, nosso último dia em Zhangjiajie foi de pesquisa e tranquilidade. Tranquilidade porque estávamos quebrados e ficamos a maior parte do tempo na horizontal e pesquisa pois em dois dias pegaríamos um voo para o Japão de Hong Kong, e sabe o que estava prestes a acontecer em Hong Kong e o resto do sul da China? O Tufão mais maligno dos últimos anos 🙂
Ficamos domingo analisando nossas possibilidades e vimos que o melhor seria esperar a tempestade e observar a situação depois. Nosso trem sairia às 15h de segunda-feira para chegar terça-feira de manhã em Shenzhen, de onde passaríamos para HK. O tufão veio, passou e não fez muita coisa por lá, porém O ÚNICO trem cancelado do dia sabe qual foi? Isso mesmo, o nosso. Não dava para atrasar nossa chegada para HK pois o avião iria partir quarta-feira de manhã, ou seja, chegaríamos lá terça a tarde para só dormir e ir pro aeroporto. Qualquer trem de Zhangjiajie para Shenzhen tem mais de 15 horas de duração e todos estavam lotados. Enfim, na correria maluca da estação de trem onde ninguém falava inglês conseguimos, segunda de manhã, passagens para um trem que partia no mesmo dia mas só tinha lugar no vagão em que você vai sentado. 18 horas. Sentados (antes íamos no vagão leito). E não, não são assentos tipo de avião ou de trem bala, eram umas cadeirinhas de plástico mais tristes que a vida de um mágico de festas infantis. Duras e apertadas. Foram 18 horas em um vagão lotado, com todo mundo se espremendo e fazendo malabarismo para dormir. Foi complicado, mas pelo menos assisti Blade Runner 2049 nesse trem! Meu deus que filme maravilhoso. Quase mostrei pro chinês ao meu lado, pois todo mundo tem que conhecer.

Dito isso, conseguimos chegar vivos em Shenzhen e finalmente HK. Ficamos pouco tempo lá, pois voltaríamos pós Japão, mas gostei do clima de “cidadezona proibida”. Um lugar global, mas ainda com personalidade. Nada glamuroso como uma Nova York da vida, mas com aquele clima de “porto de filme noir”. Acho que eu assisti filmes demais de Jackie Chan, Bruce Lee, John Woo e cia, mas HK tem uma aura muito bacana pra mim. Algo suspeito sempre parece estar acontecendo.
Depois de toda essa jornada partimos pro Japão, um dos meus países mais aguardados da viagem. Um pequeno spoiler, eu amei aquele lugar.
Tóquio é meu paraíso e onde salvarei o mundo da invasão Kaiju, mas Kyoto é onde morarei após ser idolatrado pela humanidade.
Mais do Japão no próximo post.
Beijos Quentes